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[News] "Vale Tudo": Valia a pena ser honesto no Brasil de 1988?

Olhando 20 anos para trás, a pergunta levantada pela novela Vale Tudo, da TV Globo, soa ainda atual, e ainda parece ter resposta difícil. E a novela continua moderna - em tema, forma e estrutura - e mantém a aura de hit que ostentou nos sete meses em que ficou no ar, algo que vai muito além do mistério “quem matou Odete Roitman?”.

Odete Roitman, nunca houve vilã como a interpretada por Beatriz Segall - Nazaré Tedesco (de Senhora do Destino) e Bia Falcão (de Belíssima) devem muito a ela. Heleninha Roitman, nunca houve uma alcóolatra tão convincente na TV quanto aquela de Renata Sorrah. E nunca uma novela teve um final tão ousado quanto aquele, com o inescrupuloso Marco Aurélio (Reginaldo Faria) fugindo do País pilotando um avião, e dando uma banana para o Cristo Redentor.

Vale Tudo juntou “dois dos melhores autores de novela dos últimos tempos: Gilberto Braga e Aguinaldo Silva”, nas palavras do mestre Silvio de Abreu (além dos dois, Leonor Basséres escrevia os capítulos). “Cada um desenvolvendo de maneira igualmente brilhante as suas especialidades como novelistas: o gosto sofisticado de Gilberto e o iminentemente popular de Aguinaldo, uma mistura maravilhosamente explosiva”, observa o autor.

No pós-censura, o País quase à deriva num caos econômico, a novela conseguiu resumir em seus 30 personagens o que seria a alma do brasileiro de então, suas frustrações, seu medo do futuro e sentimento de “salve-se quem puder” que acalentava. Muito vilã, mas de certa forma meio heroína, Maria de Fátima (Glória Pires) parecia ser a senha das inversões de valores que estariam por vir na sociedade. A audiência ficou chocada ao vê-la pisotear o orgulho da mãe, a batalhadora Raquel (Regina Duarte), para subir na vida.

Hoje, veja só, boa parte da maldade de Maria de Fátima pareceria coisa trivial, atitudes necessárias de quem está na batalha - como Bebel, de Paraíso Tropical, também de Gilberto Braga. Mas o politicamente correto não suporta mais um vilão sem castigo, como foi Marco Aurélio. “Cada final é um final, tudo depende do momento. Naquela hora, o que me parecia denúncia era o Marco Aurélio livre dando a famosa banana. A novela cumpriu sua função. Colocamos o assunto impunidade no ar”, avalia Gilberto, quando questionado se a TV de hoje é menos provocativa do que a daquela época. “Mais tarde, portanto, eu não tinha motivo para me repetir.”


Hoje, a banana teria outro destinatário


Se fosse possível, Reginaldo Faria não teria dúvidas em se vestir de Marco Aurélio mais uma vez, para mandar uma nova banana explosiva, como aquela do final de Vale Tudo. Só que, desta vez, ela teria endereço certo: “iria para quem está governando o Brasil”.

Na época, como foi a repercussão daquele polêmico final do Marco Aurélio?

Às vezes acontece de as pessoas agredirem os atores quando eles são vilões nas novelas. Estranhamente, aconteceu o oposto comigo. Aliás, não teve nada de estranho. Acho que as pessoas gostavam desse personagem porque, de uma certa maneira, se projetavam nele. Ele representava o brasileiro querendo se mandar daqui, e foi o que ele fez: foi embora, deu uma banana para o Brasil e saiu levando dinheiro. O País estava muito ruim, as instituições eram desacreditadas, a inflação, enorme. Então, as pessoas não tinham sentimento ideológico, só pensavam em aplicações financeiras.

Então, a banana não foi mal recebida? Hoje, a audiência rejeita vilões que não são punidos.

Nós estamos vivendo uma democracia entre aspas para a qual nós lutamos, e nos decepcionamos. Então, hoje a decepção com qualquer elemento desses que passam pelas diversas CPIs é completamente diferente daquela época.

E para levar uma novela tão ácida como aquela...

Foi um ato de muita coragem do Gilberto Braga naquela época. Sinto que hoje em dia ele não faz mais isso.

A televisão não era mais provocativa?

Acho que vinha da formação política daquela geração, pessoas que tinham vivido momentos muito cruéis. Tudo isso machucava.

E estava represado.

Sim, nós tínhamos uma vontade muito grande de contar as nosssas verdades. Acho, inclusive, que a TV era muito mais atuante do que hoje.

Se fosse hoje, o Marco Aurélio daria uma banana para o País?

Se fosse hoje, a banana iria para quem está governando o Brasil.

Fonte: O Estado de SP

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